quinta-feira, 14 de julho de 2016

Meu processo de aceitação e "misantropia"

Se você tem depressão aconselho MUITO ler esse texto. Recebi um comentário nestes dias sobre um texto que escrevi sobre magrofobia e percebi que o texto não atingiu da forma que deveria, parecendo mais um deboche do que uma explicação do termo. Isso aconteceu porque muita gente ainda não leu sobre meu processo de aceitação da minha aparência. Enfim, eu queria explicar melhor sobre o assunto, como eu cheguei a me gostar como eu gosto hoje e espero que isso seja de utilidade para as meninas magras que leram meu outro post assim como os demais que estão lendo agora também. Obs.: deixo claro que a minha história parece aquelas de filme hollywoodiano.

Eu sempre fui muuuito magra, mas muito mesmo. Magra e alta. Sempre fui a mais magra e a mais alta da turma e isso sempre me atrapalhou bastante, porque sempre minhas amigas eram mais baixas que eu e sempre levava os apelidos de magrela, palito, olívia palito, enfim, isso ainda no ensino fundamental I. Na época isso não me ofendia muito, porque eu sou negra e as ofensas eram direcionadas 90% ao meu cabelo e tom de pele, então a magreza ficava como a cereja do bolo, tipo: "sua macaca do cabelo ruim, magrela, puta".

Quando eu fui para o ginásio foi aí que as coisas começaram a ficar bem piores, porque é bem nesta fase que a puberdade aflora e, consequentemente os interesses românticos também afloram junto. Adivinha quem sempre ficou pra escanteio? Sim, eu mesma. Nunca tive ninguém, mas ninguém mesmo que gostasse ou demonstrasse interesse por mim ou que me falasse que eu era bonita. Eu só era lembrada para ser xingada, como se eu fosse um verdadeiro alvo de ofensas, um saco de pancadas. Às vezes eu ficava me perguntando: será que tá escrito na minha cara: "desconte sua raiva aqui!"? Porque eu me via como o alvo da sala, qualquer questionamento que eu fizesse a professora, qualquer coisa que eu falasse em sala de aula era motivo para ser xingada e caçoada. Eu penso que naquela época se eu tivesse sido mais fraca ainda tinha tudo para ter cometido um suicídio mesmo, porque eu mal tinha apoio de parentes, meus pais sempre foram muito ausentes, então eu mal tinha alguém para me comunicar.

E o que tudo isso tem a ver com o processo de aceitação? Que eu era uma negra, magrela, sem graça, feia, descabelada,cheia de espinhas, coluna torta, aparelho, sem amigos, desengonçada, enfim, uma escória, um fracasso. E como se isso já não bastasse eu sempre gostei de moda alternativa e eu já me vestia como emo(!) desde aquela época (leia se 2007), cabelo com franjão de chapinha, calça colada, blusa de xadrez, all star, músicas emo.

E todos estes traços me faziam sentir a pior pessoa do mundo, porque eu não tinha um pingo de expectativa de vida. A única coisa que me mantinha viva era o sonho de estudar e se tornar alguém importante, como se isso fosse a maior vingança que eu pudesse fazer contra todos que me diminuíram na minha vida. E será, porque hoje eu estou em uma universidade pública e tem muitos daquela época que me jogavam um "tinha que ser preto pra ser burra assim" dentro de empresas lixo, com cargos lixo, vivendo uma vida de lixo. Não que eu desconsidere que o serviço de faxinar, ser secretário ou trabalhar em restaurantes/fast foods seja digno, mas confesso que esperava muito mais de alguém que jogava todo dia na minha cara que ia entrar na USP ou que ia estudar em colégio tal e ser rico. Coisas de crianças.

Eu vou ser sincera, nunca chorei  ou demonstrei tristeza em sala de aula ou em público, nem mesmo em casa, porque eu NUNCA consegui, talvez porque essa dor de nunca ter sido aceita não fazia muita diferença na minha vida, afinal eu nunca quis ser aceita por  ninguém, eu levava a vida da minha forma, nunca fiz nada para ser socialmente aceita em grupos, mas mesmo assim a dor da rejeição era muito grande, porque eu não conseguia nem fazer minhas coisas em paz. E tudo que eu queria era viver em paz, sem ninguém no meu pé. Mas isso não diminuiu meus sintomas de depressão. Eu não tirava fotos (não tenho nenhuma foto de 2009/2010), eu não fazia amigos, não saia de casa, minha notas afundaram, eu passava dias sem olhar no espelho.

E com isso a consequência foi que eu passei a ter um ódio horrendo de pessoas, mais precisamente de homens. Eu sempre odiei todo mundo, mas depois disso eu passei a ter misantropia mesmo, eu odiava qualquer relação social, qualquer pessoa, ainda mais se fosse um homem. Até hoje eu passo por situações assim, eu ainda não consegui gostar de nenhum homem, meu extinto é maior e faz eu machucá-lo de alguma forma, às vezes acho garotos legais comigo que eu simplesmente não acredito que ele continuará sendo legal comigo, pra mim eles sempre querem me destruir e, com isso eu os destruo primeiro. Parece legal isso, na sociedade de hoje mas, de verdade, não é. Isso é horrível, eu machuco as pessoas sem nem perceber.

Enfim, eu só comecei a mudar no ensino médio mesmo, quando eu ganhei bolsa integral em uma escola particular depois de ralar na escola pública o ano inteiro e comecei a estudar sobre racismo, religião, política, lá eu tive aula de tudo isso e foi aí que a ficha caiu. Na verdade eu sempre fui uma pessoa incrível e mal compreendida, porque eu olho meu passado e vi que fui sim muito forte, a ponto de aguentar tanta coisa nas costas, mas tanta coisa que vocês não tem noção. E tudo eu achava que a culpa era 100% minha, EU estava errada, EU era feia, EU era o erro, mas não era. E eu tava certa, errada é a nossa sociedade, preconceituosa, conservadora, lixo. Eu fiz MUITO certo me isolar (gabriela wins), porque foi a partir daí que comecei a perceber o que EU gostava, o que EU queria e o que agradava A MIM não aos demais. Meu corpo é só meu e eu que decido o que eu vou fazer com ele. Por que que não me falaram isso antes? Puta que pariu, hoje estaria sofrendo em Paris!

E depois disso eu comecei a ter noção de que pessoas que te fazem sentir mal, pessoas que te fazem sentir pior ou excluídas devem SER EXLUÍDAS DA SUA VIDA DE UMA VEZ POR TODAS. Não faça questão de"manter uma amizade porque fulano é assim mesmo", não romantize sofrimento com ninguém, você não precisa disso. Existem milhares de pessoas legais, um mundo gigante que você possa explorar. GENTE LEGAL É AQUELA QUE TE APOIA! E fim de papo!

Sabe aquela amiga que vem com aquele papinho de: "aí miga, tira essa cor do seu cabelo, não gostei, não ficou legal" ou "nossa como você tá gorda/magrela, tá muito feia assim" ou "mas você não combina com isso", "eu tenho vergonha de você quando faz tal coisa" ISSO. NÃO. É. AMIGA. Amiga é aquela que quando te vê pra baixo te diz poxa miga, você é linda, olha esse seu cabelo, olha esse seu jeitinho único de ser, levanta esse astral! Ela te anima, te mostra mais uma vez que você não tá errada, que errado é o mundo doente que nós vivemos.

Portanto a conclusão para tudo isso é que quando você se sentir um lixo, olhe para os lados e veja quem é que te influencia a se sentir assim. O que está errado, do que você não gosta? Tente mudar, sinta-se bem com que você é, porque a gente é único e especial, só falta você perceber.

Tem continuação deste post. Aguardem!